O que é mesmo a felicidade? Todos, com alguma certeza, desejam a felicidade e a realização para a sua existência. Mas por que nem todos a conseguem encontrar?

Eu quero a felicidade e acredito que você também, pois tendemos essencialmente a isso… Mas o que é mesmo felicidade?

Todos nós gostaríamos de torná-la parte integrante do nosso ser, no fundo da nossa alma … e poder cantar de alegria, chorar e amar de alegria!

Mas como conseguir algo tão grande? De onde provém a alegria? Como é possível que comece tão efusivamente e se vá embora tão depressa? Como fazer para nunca perdê-la?

É difícil responder a estas perguntas porque a alegria tem uma natureza muito peculiar. Quando se quer adquirir uma coisa comum, sabe-se como consegui-lo. A alegria não. Se perguntarmos a alguém como ganhar dinheiro, nos responderá: <<Trabalhe>>; se o interrogamos como aprender matemática, nos dirá: <<Estude>>; sobre como encontrar emprego, aconselhará: <<Procure-o>>. Mas se alguém nos questiona sobre como ser uma pessoa alegre, ficamos perplexos, não sabemos como responder. Ninguém aceita pacificamente que lhe digamos: <<Esforce-se, cante, ria, tenha bom humor…>>

Por que? Porque a alegria é algo diferente, tem uma natureza singular. Já Aristóteles e São Tomás de Aquino descobriram o seu caráter peculiar: a alegria, mais do que uma simples virtude, é o fruto, o resultado de uma vivência.

Nós diríamos que é como que a manifestação sensível de uma situação interior, ou melhor, o sintoma mais preciso de um íntimo ajustamento pessoal. Se a dor é o sinal – o censor – de um estado patológico, a alegria é o indicador de um estado de plenitude vital.

Assim o expressa Bergson: “A natureza avisa-nos por um sinal preciso que o nosso destino está atingido. Esse sinal é a alegria […]. Onde há alegria, há realização.

Assim, a alegria é como um radar que se põe em movimento quando percebemos – por uma íntima convicção – que nos estamos dirigindo para o centro gravitacional da nossa existência, que é a felicidade. Não é necessário que estejamos na posse real dessa felicidade. Basta que tenhamos a expectativa real de estar no caminho que a ela nos conduz, como belamente o expressa o Salmo: “Alegrei-me quando me disseram: Vamos à casa do Senhor (Sl 122:1)… Basta ter consciência de estarmos enveredando pelo roteiro que nos leva à felicidade.

É por isso que ter ou não ter alegria representa como que um diagnóstico definitivo da personalidade humana. É como um teste de qualidade que mede o valor da nossa vida.

Analisando o significado da palavra felicidade, busquemos compreender o que é estar no caminho. Felicidade vem do latim ‘felicitas’ (felicitatis) que brota da palavra felix. No latim, originalmente a palavra felix queria dizer fértil, frutuoso, que gera frutos, fecundo.

Isso se revela muito iluminador para compreendermos, a partir da etimologia da palavra, o que nos propõe este termo que se tornou para nós um conceito específico. A fertilidade e a fecundidade são atributos essenciais para que a felicidade possa verdadeiramente acontecer, ou seja, ela (a felicidade) é uma realidade que só pode se fazer real em solos que se tornam fecundos e férteis.

Ela só será presença concreta em corações que descobriram que é necessário superar todo fechamento, para assim poder gerar vida, saindo de si e não se trancafiando nas cadeias dos próprios interesses (muitas vezes, extremamente egoístas).

Vivemos em uma época profundamente marcada pelo individualismo e pela preguiça de se ofertar – desinteressadamente. Somos ensinados, desde a mais tenra idade, a buscar somente aquilo que nos interessa: o meu trabalho, o meu futuro, as minhas razões, a minha dor, a minha vida, o meu ministério… e, particularmente por isso, muitas vezes não alcançamos uma concreta felicidade. Assim, acabamos perdendo um de seus atributos mais essenciais: a fecundidade que faz com que geremos vida ao nosso redor, assim descobrindo novos motivos para construir a própria história além apenas das próprias expectativas e projeções egoísticas.

Sem uma real abertura aos demais não poderá haver uma verdadeira felicidade. Ela é êxodo. É saída e não chegada. É encontro com o tu e com o eu. É um constante caminho, e jamais poderá ser encontrada no comodismo e na estaticidade.

Essa referida “saída de nós mesmos” em realidade nos faz mais gente, libertando-nos de apegos e desejos infantis que antes só serviam para nos inchar, escravizando-nos em uma compreensão irreal e alienada de nós mesmos, que somente os nossos olhos – muitas vezes, míopes… – eram capazes de enxergar.

Felicidade equivale também – de maneira específica e precisa – à maturidade, a uma plenitude humana que liberta de ilusões pretensiosas e nos coloca no verdadeiro lugar confiado a nós pela existência. A maturidade é capaz de revelar a verdade acerca de nós mesmos, possibilitando-nos uma peculiar integração de nossos múltiplos aspectos: todos os fatos, ganhos e perdas que na vida experienciamos e que não devemos negar nem desprezar, pois tudo isso nos constrói, nos colocando na rota da realização.

Sem dúvida alguma, realizando essa integração – impulsionada pela maturidade – de todos os fatos e etapas que compõem nossa vida, bons e ruins, poderemos ser mais inteiros e aptos a conquistar a felicidade, pois, nesta construção a que estamos nos empenhando, tudo o que vivemos tem o seu valor, tudo ajuda a nos construir e nada pode ser desprezado.

Seguindo ainda a trilha que nos possibilitará a compreensão da felicidade, trago agora a contribuição do filósofo Aristóteles, que nos enriquece significativamente com a sua percepção acerca desta realidade. Para ele a felicidade é conquistada/construída pelo exercício da virtude (realidade que possibilita a maturidade) e não da posse. Isso nos sinaliza claramente que apenas posses e bens (uma satisfação total dos próprios desejos e instintos) não serão capazes de preencher todas as nossas ausências, e que, se não forem bem geridos e direcionados, poderão até fabricar muitos outros conflitos e vazios.

Já a virtude, que é construída por um esforço contínuo e responsável, é realidade bem diferente. Ela é amiga da maturidade e costuma com esta sempre se encontrar. A virtude se apresenta como uma luta consciente pela construção do bem e não como uma prática irrefletida que busca apenas a satisfação imediata dos próprios instintos (apenas o prazer pelo prazer).

A virtude educa, liberta, gera a maturidade. A posse – sem uma devida e anterior posse de si mesmo – pode tornar-se escravidão, fazendo com que a pessoa seja possuída pelo que tem e assim não o consiga gerir/possuir.

A tão ansiada felicidade que aqui buscamos compreender é realidade que precisa ser conquistada sob vários degraus, em um esforço de contínua ascese (subida) e busca pela virtude. Sem bons hábitos (virtudes) que gerem uma vida mais saudável em todos os aspectos (físico, psíquico, emocional e espiritual), a felicidade não encontrará o terreno necessário para poder verdadeiramente acontecer em nós.

É também extremamente necessária a compreensão de que a conquista da felicidade pela via da virtude precisa ser construída a partir de cada fragmento de nossa vida: em cada um dos pedaços que compõem o todo de nossa existência. Afinal, é do pequeno que pode surgir o grande e é a partir dos pedaços que surgirá a específica tonalidade que envolverá a totalidade.

Se em cada fragmento a felicidade for realmente buscada e construída, com muito mais facilidade ela poderá revelar os belos traços de seu “rosto” em toda a nossa vida e história. Fecundidade, virtude, intensidade nos fragmentos. Faces deste processo a ser vivenciado e construído a cada passo, um processo de intensa luta pela aquisição da referida maturidade, que por sua vez dará à luz a felicidade.

Este etapa do caminho se encerra aqui. Deixo você com o sabor dessas provocações e manifesto o desejo de que, tanto eu como você, queiramos verdadeiramente construir e apreender a felicidade em cada esquina e detalhe que configura nossa história.

Responsável pelo artigo: Antonio Guerrero de Andrade, pr.