Conheça um pouco mais do conteúdo do novo e-book de Páscoa da Rede Comuna

No Evangelho de João, depois do lava-pés vêm os discursos de despedida de Jesus (capítulos 14-16), que no final, no capítulo 17, desembocam numa grande oração. A estrutura do rito descrito em Levítico 16 é retomada

minuciosamente na oração de Jesus: tal como o Sumo Sacerdote cumpre a expiação por si, pela classe sacerdotal e por toda a comunidade de Israel, assim também Jesus ora por Si mesmo, pelos Apóstolos e finalmente por todos aqueles que depois, por causa da palavra deles, haveriam de acreditar nele, ou seja, pela Igreja de todos os tempos.

Quatro temas importantes da oração sacerdotal de Jesus

1. “A vida eterna é esta”

O tema “vida” (zõe), que desde o início permeia todo o Evangelho, aparece necessariamente também na nova liturgia da expiação, que se realiza na Oração Sacerdotal. A expressão “vida eterna” não significa – a vida que vem depois da morte, enquanto a vida atual seria passageira e não uma vida eterna. “Vida eterna” significa a vida no sentido mais próprio e verdadeiro, a qual pode ser vivida mesmo neste tempo e contra a qual, depois, já nada pode fazer a morte física. É isto que interessa: abraçar já desde agora “a vida”, a vida verdadeira, que já não pode ser destruída por nada e por ninguém.

Mas como se pode chegar a isso? A Oração Sacerdotal dá uma resposta talvez surpreendente, mas já preparada no contexto do pensamento bíblico: o homem encontra a “vida eterna” por meio do “conhecimento”, mas pressupondo aqui o conceito de “conhecer” segundo o qual conhecer cria comunhão, é identificar-se com o conhecido. Naturalmente não qualquer conhecimento seria a chave da vida, mas sim o fato de “que eles Te conheçam a Ti, único Deus verdadeiro, e Aquele que enviaste, Jesus Cristo” (17.3). 

Porém esse Deus se torna acessível ao cristão naquele que Ele mesmo mandou: Jesus Cristo. No encontro com Ele, verifica-se aquele conhecimento de Deus que se torna comunhão e desse modo torna-se “vida”. Consequentemente, a “vida eterna” é um fato relacional.

2. “Consagra-os na verdade”

Na oração pelos discípulos, Jesus faz o que chamamos de tríplice consagração: o Pai consagrou o Filho e enviou-O ao mundo; O Filho consagra-Se a Si mesmo e pede que, a partir da sua consagração os discípulos sejam consagrados na verdade.

O que significam as três consagrações (santificações)? Encontramos resposta na vocação do profeta Jeremias: “Antes mesmo de te formar no ventre materno eu te conheci; antes que saísses do seio, eu te consagrei. Eu te constituí profeta para as nações” (Jr. 1.5). Consagração significa a reivindicação total do homem por parte de Deus, a separação para Ele, que, todavia, é ao mesmo tempo uma missão para os povos.

3. “Eu lhes dei a conhecer o Teu nome”

Outro tema fundamental da Oração Sacerdotal é a revelação do nome de Deus. A expressão “nome de Deus” significa: Deus como Aquele que está presente no meio dos homens. É o próprio Deus como Aquele que Se nos dá; Ele, não obstante toda a certeza da Sua proximidade e toda a alegria por esse fato, permanece sempre infinitamente maior.

Esse é o conceito do nome de Deus, com base no qual fala Jesus. Quando diz que deu a conhecer o nome de Deus e quer ainda dá-lo a conhecer mais, não pretende com isso referir-Se a qualquer palavra nova que Ele teria comunicado aos homens como palavra particularmente adequada para qualificar Deus. A revelação do nome é um modo novo da presença de Deus entre os homens, um modo novo e radical em que Deus Se torna presente no meio dos homens. Em Jesus, Deus entra totalmente no mundo dos homens: quem vê Jesus, vê o Pai.

Em Cristo, Deus vem continuamente ao encontro dos homens para que estes possam ir ao encontro dele. Mediante o encontro com Cristo Deus aproxima-se de nós, atrai-nos a Si para nos conduzir, por assim dizer, para além de nós mesmos, rumo à amplitude infinita da sua grandeza e do seu amor.

4. “Para que todos sejam um”

Outro grande tema da Oração Sacerdotal é a futura unidade dos discípulos de Jesus. Assim, o olhar de Jesus – de modo único nos Evangelhos – estende-se para além da comunidade dos discípulos de então e fixa-se em todos aqueles que “por meio de sua palavra, crerão em Mim” (Jo. 17.20): abre-se o vasto horizonte da comunidade futura dos crentes através das gerações, a futura Igreja está incluída na oração de Jesus. Ele invoca a unidade para os futuros discípulos.

Jesus orou por uma unidade, que só é possível a partir de Deus e por meio de Cristo, mas uma unidade que aparece de modo tão concreto que se torna evidente a força presente e operante de Deus. Por isso, a fadiga em prol de uma unidade visível dos discípulos de Cristo permanece uma tarefa urgente para os cristãos de todos os tempos e lugares. A unidade invisível da “comunidade” não basta.

A Igreja nasce da oração de Jesus. Mas essa oração não é meramente palavra: é o ato em que Ele “Se consagra” a Si mesmo, isto é, “Se sacrifica” pela vida do mundo. Podemos dizer também, invertendo a afirmação: na oração, o acontecimento cruel da cruz torna-se “Palavra”, torna-se festa da Expiação entre Deus e o mundo. Disso nasce a Igreja como a comunidade daqueles que, por meio da palavra dos Apóstolos, creem em Cristo.

Leia mais no novo e-bool da Rede Comuna: “Páscoa – Morte de Cristo e Vida do Cristão”